A VOZ DO POVO NÃO É A VOZ DE DEUS...!

Com base em 1 Sm 8.1-22 pretendo enfocar os aspectos que diferenciam a voz do povo da voz de Deus, ou seja, até que ponto a vontade de Deus é expressa na forma de agir de um povo que por Ele clama e que se diz ser Seu! Preliminarmente, é importante destacar que 1 Samuel cobre um período de cerca de 140 anos, iniciando com o nascimento de Samuel, em torno de 1150 a.C e terminando com a morte de Saul, em torno de 1010 a.C. Ao examinarmos o cenário antecedente deste livro  e de seu conteúdo vemos que: Israel fora governado por juízes que Deus levantou em momentos cruciais da sua história; no entanto, Israel havia se degenerado moral e politicamente. Estivera sob investidas violentas e impiedosas dos filisteus. O templo de Siló fora profanado e o sacerdócio se mostrara corrupto e imoral. Em meio a essa confusão política e religiosa surge Samuel, o filho de Ana. O menino cresce, assume o lugar do profeta Eli e passa a gozar de imenso prestígio entre o povo, porém seus filhos não continuaram bem seu ofício, pois não eram reflexos do seu caráter piedoso. O povo não tinha confiança nos seus filhos como juízes; e, então, sucedeu que à medida que Samuel envelhecia, pressionavam-no para que lhes desse um rei. O Senhor não queria isso para Seu povo. O profeta Samuel relutou, mas, finalmente, como era vontade dos homens, acaba cedendo e unge Saul como primeiro rei de Israel. Mas o futuro logo revelou quão desastrada fora a medida. A impaciência de Saul fez com que exercesse funções sacerdotais, em vez de esperar por Samuel. Depois de desprezar os mandamentos de Deus, foi rejeitado pelo Senhor. E o Espírito Santo dele se afastou. Depois dessa rejeição, Saul tornou-se uma figura trágica, consumida por ciúme e medo, perdendo gradualmente a sua sanidade. Gastou seus últimos anos em uma incansável perseguição a Davi através das regiões montanhosas e desérticas do seu reino, em um desesperado esforço para eliminá-lo. Davi, no entanto, encontrou um aliado em Jônatas, filho de Saul. Ele advertiu Davi sobre os planos do seu pai para matá-lo. Finalmente, depois que Saul e Jônatas são mortos em batalha, o cenário está pronto para que Davi se torne o segundo rei de Israel. Já 2 Samuel trata da ascensão de Davi ao trono e dos quarenta anos do seu reinado. O livro está focado na pessoa de Davi. Começa com a morte de Saul e Jônatas na batalha do monte Gilboa. Davi é, então, ungido rei sobre Judá, sua própria tribo. Há um jogo de poder pela casa de Saul entre Isbosete, filho de Saul e Abner comandante-chefe dos exércitos de Saul. Embora a rebelião tenha sido sufocada, esse relato sumário descreve os sete anos e meio anteriores à unificação do reino por Davi. Davi unifica tanto a vida religiosa quanto política da nação ao trazer a arca do Testemunho da casa de Abinadabe, onde havia estado deste que fora recuperada dos filisteus. Davi derrota com sucesso os inimigos de Israel, e inicia-se um período de estabilidade e prosperidade. Tristemente, porém, sua vulnerabilidade e fraqueza o leva ao pecado com Bate-Seba e ao assassinato de Urias, esposo dela. Apesar do arrependimento de Davi, depois de confrontado pelo profeta Natã, as conseqüências da sua ação são declaradas: “Agora, pois, não se apartará a espada jamais de tua casa” (12.10). Absalão, filho de Davi, depois de uma longa separação de seu pai, instiga uma rebelião contra o rei, e Davi foge de Jerusalém. A rebelião termina quando Absalão, pendurado em uma árvore pelos cabelos, é morto por Joabe. Há uma desavença entre Israel e Judá a respeito da volta do rei a Jerusalém. Um rebelde chamado Seba instiga Israel a abandonar Davi e a voltar para casa. Embora Davi tome uma série de decisões desafortunadas e pouco sábias, a rebelião é sufocada, e Davi é mais uma vez estabelecido em Jerusalém. E a história prossegue e está descrita tanto em 1 e 2 Reis quanto em 1 e 2 Crônicas. E aí se conhece a história da divisão do Reino, após a morte de Salomão. De como tanto o Reino de Israel assim como Judá estiveram em processos de avanço e recuo moral e religioso, de como se deu o fim de Israel, levado cativo pelos assírios e como ocorreu o fim de Judá, levado cativo pelos babilônicos. E o tempo dos reis, finalmente, termina em 586 a.C, com a queda de Jerusalém. Considerando que o início do reinado de Saul se deu em 1040 a.C, conclui-se que a monarquia durou, aproximadamente, 454 anos, mas, certamente, poderia ter durado até os dias atuais. Isso em relação ao Reino de Judá, mas quanto ao Reino de Israel, posto que a queda de Samaria se deu em 721, a monarquia ali durou, apenas, 319 anos, portanto, 135 anos a menos que o Reino de Judá.
A questão que se coloca está centrada em 1 Sm 8.1-22 quando os hebreus pedem ao profeta Samuel por um rei.
Então, qual a voz e a vontade dos homens? Um rei que lhes governassem, como os povos vizinhos.
E qual a voz e a vontade de Deus, inclusive preliminarmente manifesta por Seu profeta Samuel? (v.6): “Porém esta palavra não agradou a Samuel, quando disseram: Dá-nos um rei, para que nos governe.”
O que fez o profeta? Consultou o Senhor (v.6c): “Então, Samuel orou ao Senhor”.
E o que disse o Senhor à Samuel? (v.7 - 9):” Atende a voz do povo em tudo quanto te diz, pois não te rejeitou a ti, mas a Mim, para Eu não reinar sobre ele. Segundo todas as obras que fez desde o dia que o tirei do Egito até hoje, pois a mim me deixou e a outros deuses serviu, assim como o faz a ti. Agora, pois, atende à tua voz, porém adverte-o solenemente e explica-lhe qual será o direito do rei que houver de reinar sobre ele”.
Ou seja, minha interpretação do texto bíblico: este é o desejo do povo, não é o Meu (diz o Senhor), mas se o povo assim quer, que assim seja; mas antes, adverte-o sobre os males da monarquia, quem sabe o povo mude de idéia!
E aí passa Samuel a descrever ao povo reunido o que um rei, geralmente, faz a seu povo (v.11 a 17):
1) toma os filhos e emprega no serviço de seus carros, como cavaleiros; toma a outros, como lavradores do campo, a outros, para fabricarem armas de guerra, a outros, como perfumistas, cozinheiros e padeiros;
2) toma o melhor das lavouras e das vinhas, dos olivais e dá aos seus servidores; de igual modo as sementeiras e as vinhas para dar aos seus oficiais e aos seus servidores;
3) requisita os servos e servas, e o melhor dos jovens, para seu trabalho; de igual modo, toma o rebanho e todos serão seus servos.
E o mais grave, ainda, falou o profeta, em nome do Senhor, ao povo (v.18): “Então, naquele dia, (o dia mau) clamareis por causa do vosso rei que houverdes escolhido; mas o Senhor não vos ouvirá naquele dia”.
Mesmo assim, com toda a força da argumentação contrária à instituição da monarquia, o povo não cedeu e insistiu:
(v.19b): “NÃO! Mas teremos um rei sobre nós”.
E o que fez o profeta? Falou ao Senhor as palavras do povo. E o Senhor simplesmente disse:
(v.22b): “Atende a sua voz e estabelece-lhe um rei”.  Novamente insisto na interpretação do texto bíblico: esta não é Minha vontade (diz o Senhor), mas o povo quer; Eu concedo, Eu permito que aconteça, faça-se, então, sua vontade e que ele (o povo) suporte as consequências!
Sabemos que a vontade de Deus se cumpre sempre. Sabemos, igualmente, que o homem é dotado de inteligência e vontade própria. Assim, tanto o homem tem vontade, quanto Deus tem vontade. Isso soa como óbvio, mas me interessa ser didático para elucidar bem a questão. Deus é sempre presente (onipresente), é sempre sabedor e conhecedor de todas as coisas (onisciente), nada acontece que não seja de Sua vontade.
Mas a vontade de Deus adquire duplo contorno em Suas atitudes, tanto pode ser concessiva, permissível, quanto volitiva. O que isso significa?
Inicialmente, permitam-me esclarecer: este é um assunto teológico polêmico, em que muitos não aceitam o que vou escrever a seguir, mas continuo sustentando isso. E o que afirmo?
Que não somos (nós os seres humanos) robôs ou marionetes, mas que temos vontade própria, e que Deus reconhece e valida isso. Afinal, Ele quis assim. Foi desejo e vontade dEle que o homem, feito à Sua imagem e semelhança, se posicionasse através de suas escolhas. Ele, o Senhor, estabeleceu parâmetros e paradigmas que se encontram revelados e dispostos em Sua Palavra, a Bíblia Sagrada. Se o homem estiver apto a viver e conviver segundo seus mandamentos e princípios, deve escolher uma vida de retidão e temor a Deus, mediante os muitos exemplos de homens e mulheres da Bíblia, que se deixaram conduzir pelas Suas instruções, reveladas aos profetas e pelo ensino do Filho amado Jesus Cristo.
A vontade de Deus se expressa em ações concessivas e permissíveis quando se materializa em situações em que o homem faz sua escolha, comunica ou não a Ele, e não espera por Sua resposta, simplesmente vai e faz. Como o Senhor a tudo vê, de tudo sabe e percebe, e como nada acontece sem que Ele deixe acontecer, tudo simplesmente acontece; não é expressamente Sua vontade, é a do homem; mas Ele permite acontecer, Ele concede, simplesmente, e nada faz para impedir. Poderia, se quisesse, agir e impedir a ação do homem, mas não faz; o homem é livre, tanto para tomar decisões quanto a tê-Lo, quanto a não tê-Lo. E Ele, o Senhor, respeita isso. É parte do conjunto de Seus princípios; caso contrário, nada teria sentido e teologicamente, teríamos que afirmar que o mal é causado por Deus que é mau, mas ao contrário, Ele é Amor (1 Jo 4.8b). Então a verdade é que do Senhor somente provêm coisas e ações boas, nunca ruins ou más; mas este já não é o caso do homem!
A vontade de Deus se expressa em atitudes volitivas quando é a Sua verdadeira manifestação divina. É a expressão de Sua magna vontade. Acontece quando pessoalmente Ele interfere nas ações, fatos e processos. É o agir de Deus, por Sua graça, livremente, que acontece quando Ele lança o olhar sobre algo ou sobre alguém. Ou, então, acontece quando o Senhor ouve e atende a oração de alguém que pede por Sua ação e pelo Seu agir, cumprindo-se a Sua vontade. Não sem razão Jesus veio ao mundo com uma missão: fazer a vontade de Deus (Hb 10.7,9). E nós... será que temos feito a vontade de Deus? Jesus espera que façamos, ou melhor, que deixemos Deus fazer Sua vontade nas nossas vidas. Mas isso parece ser tarefa muito difícil e, embora afirmemos que desejamos que a vontade de Deus seja feita (Mt 6.10), quase sempre, ao final, prevalece a nossa. Muitos são os que, geralmente, até querem fazer a vontade de Deus, mas reconhecem ser tarefa difícil, e aí desistem e fazem segundo sua própria vontade.
A verdade é que os cristãos precisam seguir o conselho do apóstolo Pedro: "Para que no tempo que nos resta na carne, não vivais mais segundo as concupiscências dos homens, mas segundo a vontade de Deus" (1 Pe 4.2). Ou seja, enquanto vivos, aqui na terra, procuremos não seguir nossa própria voz, impulsos ou desejos, mas a voz e a vontade de Deus; pois, tanto o mundo, como as pessoas que fazem a vontade do mundo, passam, mas quem faz a vontade de Deus, permanece para sempre! (1 Jo 2.17). (Reflexão com base em sermão proferido na Comunidade, por este pastor, no culto de domingo 21/11/2010).

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